Texto para discussão 16/2005
O modelo de instabilidade de Harrod: uma abordagem em termos de não linearidade
Alain Hersovici*
As diferentes versões do modelo de Harrod sempre foram objeto de controvérsias importantes: os economistas neoclássicos vêem nele “uma incursão ambiciosa e extravagante na teoria dos ciclos “ (Simonsen, Cysne, 1995, p. 490); À medida que a hipótese do coeficiente de capital constante constitui a base da ”instabilidade” harrodiana, a escola neoclássica refuta a instabilidade a partir da substituabilidade perfeita dos fatores de produção em função de sua remuneração ao custo marginal (Solow R.M., 1956, p. 65). O próprio Keynes refutava a idéia da existência de uma taxa garantida (1973). Apesar das “imprecisões” presentes nas diferentes versões deste modelo, além das dificuldades teóricas enfrentadas pelo próprio autor, pretendo mostrar como Harrod , a partir de 1938, fornece elementos para construir uma análise dinâmica, utilizando o instrumental de Keynes: isto implica em fornecer uma explicação endógena da instabilidade, da existência de ponto de reversão e das modalidades de regulação do sistema. Uma análise dinâmica é, a meu ver, intrinsecamente histórica: o tempo e as decisões dos agentes econômicos são irreversíveis (Herscovici Alain, 2003 (a)). Por outro lado, conforme ressaltam os trabalhos ligados à entropia, ao estudo dos sistemas complexos, e a não linearidade, as flutuações são produzidas endogenamente pelo sistema; numa perspectiva semelhante, um sistema instável se caracteriza pela existência de path dependence e de processos de histerese, e pela existência de modalidades de regulação diferentes daquelas que prevalecem “perto” da posição de equilíbrio (Prigogine, 1996). A tese defendida neste trabalho é a seguinte: Harrod, (1937, 1938, 1939, 1948, 1963) tentou construir um modelo dinâmico a partir dos elementos estáticos da Teoria Geral 1 de Keynes. Analisarei a natureza do equilíbrio relativo à demanda efetiva, da maneira como ele foi definido na TG, e mostrarei como Harrod transpõe, em temos dinâmicos, este conceito. Neste sentido, apesar de não ser objeto de modelizações formais matemáticas, os pressupostos deste modelo se relacionam diretamente com uma abordagem não linear dos processos econômicos e das relações entre crescimento e flutuações (Besomi Danielle, 2001, p. 89). A este respeito, é importante mostrar que várias interpretações deste modelo o interpretam de uma maneira errônea: além de não considerar os elementos dinâmicos e de retranscrevê-los em um universo neoclássico, este tipo de interpretação tem que abandonar o estudo dos processos de path dependence para focalizar sua atenção sobre as condições de convergência para o estado ótimo de longo prazo (Solow R, 1956). Nesta perspectiva, boa parte dos elementos dinâmicos deixa de ser estudada (Kregel, 1980). Para demonstrar esta tese, numa primeira parte, estudarei as relações que existem, na TG, entre a Demanda Efetiva, a estabilidade do equilíbrio e a natureza das expectativas; a este respeito, ressaltarei o componente estático utilizado por Keynes na TG. Numa segunda parte, após ter explicitado as relações fundamentais de Harrod, mostrarei como este autor define vários princípios de instabilidade assim como modalidades concretas de regulação do sistema.
*Doutor em Economia pelas Universidades de Paris I Panthéon-Sorbonne e de Amiens, Coordenador do Grupo de Estudo em Macroeconomia (GREM) do Departamento de Economia da UFES, Coordenador e Professor do Mestrado.
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